Minha
rua
Foi com a minha rua que aprendi a ver o resto do mundo. Observando a sua
rotina, os meus vizinhos e a minha família por muitos anos, foi que descobri
que ela não é uma rua como outra qualquer.
Fui atrás do seu passado, do meu passado, da minha infância que nunca se
foi. Mesmo quando morei longe dela, nunca deixava que as melhores lembranças me
abandonassem. Ela faz parte de mim porque vivi e porque tive a sorte de ter uma
rua para ser lembrada, para amar, para viver, para chamar de minha. Nela eu me
descubro, me oriento, sou chamado de volta à casa outra vez. A casa simples de
número 188.
É bom reviver, não esquecer de suas esquinas, dos momentos felizes que
ela nos proporciona a cada amanhecer.O leiteiro ainda na porta, o vendedor de
frutas no seu carrinho, as crianças que passam fardadas para o colégio, o
carroceiro,as motos naquele vaivém incessante e as pessoas desconhecidas
seguindo para o mercado.
Sempre imploro ao tempo que não apague essas minhas memórias. São
lembranças importantes demais para quem tenta se descobrir, para quem ousa
mexer no que faz falta, no que não se quer esquecer. Será felicidade o que eu
sinto quando eu lembro dos banhos de chuva, quando invadia quintais
desconhecidos, quando olho a lua cheia engolindo a Praça da Bandeira?
Triste é a rua que não amanhece com mulheres varrendo suas calçadas,
conversando amenidades, enfeitando suas janelas com flores frescas em dia de
Nossa Senhora das Candeias. Nos festejos de junho, às cinco horas da manhã, o
meu aniversário e o da mamãe era festejado com a banda da Prefeitura, tocando
Aquarela do Brasil, enquanto todos se empanturravam num grandioso café da
manhã. Em tempos de Copa do Mundo, tudo ficava enfeitado com bandeirolas verde
e amarelo. A rua toda, diga-se de passagem. No São João, tinha quadrilha,
fogueiras, fogos, sanfoneiro e cerveja. Muita cerveja.
Uma rua sem memória não serve, não basta, perde o seu significado diante
das pessoas que caminham por ela.No fim de tarde, com calçada ainda morna,
observo o derradeiro raio de sol sem reclamar da ausência de nuvens
carregadas.A claridade fere, escancarando o calor.
A minha rua é a
sala de visitas. Tem cadeiras na calçada, gente dando bom dia, papagaios nos
céus de maio, vento frio nos festejos de junho. Fui criado, mamãe(atarefada no
interior da cozinha), gritando na porta dizendo que já era hora de banhar, de
comer, de dormir e sonhar.
Rua do Sol.Esse foi o primeiro nome da minha rua.Vizinha ao bairro do
Cariri, ligada à praça da Bandeira, atrás do Ginásio Santo Antonio, próxima do
mercado, perto da Demerval Lobão.
São casas de todos os tamanhos,
modelos e alturas. São múltiplas as formas dos muros (cada vez mais altos) e
impessoais. A maioria das casas pertencia ao comerciante João de Deus, fora o
casarão do Raimundo Lustosa e do pai da dona Auridéia Torres, o Sr. Deoclésio. Nela
morou também a Dona Adelaide (funcionária dos Correios), mãe da Galdência, sua
única filha que fora adotada ainda bebê. Foram embora para o Maranhão e o
Doutor Everardo, casado com Vânia Araújo, compraram a casa, que era ligada à
casa da Velha Modesta, uma solteirona que viveu sozinha por longos 85 anos. Lembro
que quando anoitecia, eu sentia o cheiro da fumaça do fogão à lenha, da
fuligem, das galinhas subindo no pé de goiaba para dormir.
O nome Padre Fábio, foi uma homenagem ao Padre Fábio José da Costa, um
sacerdote e professor inteligentíssimo, que nasceu em Campo Maior em 1863. Ele
se ordenou em Fortaleza-CE, no dia 19/06/1887 e foi o primeiro campo-maiorense
a torna-se padre. Em São Luis, no Maranhão; foi professor de Direito Canônico e
capelão da Santa Casa de Misericórdia da capital maranhense. No dia 02/12/1889,
esteve presente no ato de inauguração e bênção da Capela de Nossa Senhora de
Lourdes do Patronato de Campo Maior, assinando também, a ata de registro no
Livro do Tombo da Casa Paroquial, iniciado em 10/02/1883. Foi poeta nas
horas vagas e publicou um livro intitulado "Meus Amores". Morreu
em Campo Maior no ano de 1900.
No início da rua, perto da Praça da Bandeira , fica a casa do Sr. Nilson
e de Dona Nazi. Sempre na Semana Santa, são agraciados com a passagem da
procissão Bom Jesus dos Passos, vinda da igreja de São Pedro Nolasco. Eles
foram donos de uma mercearia que vendia de tudo na Demerval Lobão. Tinha cera
de carnaúba prensada, botões, linhas Corrente, fitas bico-de-pato, grega,bolas
de gude e bombinhas juninas.
Depois temos a casa da dona Rita Bandeira, costureira de mão fina e
batalhadora. Casada com o Sr. João, dono dos ônibus João Conrado. Em frente a
eles, tem casa do Sales, exímio jogador de damas, hoje evangélico de
carteirinha. Ao lado, a casa dos seus pais, o casal Antonio Miguel e dona Maria.
Depois, a casa de um dos fundadores do PT em nossa cidade, o casal
Cantuário e Dona Nasaré. Ligada a eles, fica a residência da minha
querida amiga Lourdinha Barros, professora aposentada e que adora cerveja, diversão
e paz. Filha de dona Julieta (já falecida), tem como irmãos o Benício Barros, o
Eliseu e o Henrique.
Tem como vizinho o Seu “Manel” que tem uma quitanda no mercado e sua esposa a
dona Maria, que fazia "flaus" saborosos com cheiro de cigarro. Em frente a casa deles, mora a funcionária aposentada
da antiga Telepisa, Maria Ioneide. Grudada a essa casa fica a da Júlia Carvalho
- faz os melhores pães de queijo da cidade e tem a calçada mais limpa do mundo.
É vizinha e amiga do casal Euripim e Das Dores. (Aliás, nessa casa morou
por muito tempo a minha irmã Helena, casada com o Didico Lustosa Machado. Muitas
recordações boas e eu sabia que era feliz).
Em frente, a casa do Seu Raimundo casado com dona Jacinta, uma católica
fervorosa. Mãe da Enói e do Gerson. Com o seu rádio de pilha inseparável,
comenta as notícias da cidade com aqueles que acordam cedo, entre eles o
Julinho, filho da dona da Miscelândea, um templo de linhas, botões e agulhas,
localizado ao lado do mercado. Depois a casa do Rui Cantuário, a do
Julinho da Farmácia e da Isa, a nossa passadeira de roupa oficial.
Chegamos na casa da dona Rita e do seu Valdimir. Pais da Solange, uma
intelectual e Doutora da UFPI.Hoje ela é viúva do Wilson Carvalho, irmão da
amiga Jurandir e Jacira.Tem como irmãos, o Solon, Suely, Salvio e o Pio.
A casa do Seu Zé Peres, fica bem na esquina, frente a frente, com o
Buraco do Saddan da Maria Augusta. Impossível não lembrar da gargalhada da Dona
Mazé, da sua alegria de viver, do humor contagiante.Hoje ele mora com a sua
filha Desterro que trabalha no Intelectus. A sua filha Eliete Peres é casada
com o meu irmão Robson Barros.
Depois temos a casa da Dona Maria do Carmo, viúva do tranquilo Sr.
Gonçalo Carvalho. Vive com a sua filha Jurandir e o filho Igor, inteligente
aluno do Colégio Intelectus.
Ao lado, a casa do Sr. Ribamar
Barbosa e sua Amparo. Mora com eles o seu filho Henrique César. São pais da
Suzy e Daniele, que mora em Brasília. Em frente a casa deles fica uma
barulhenta Igreja Mundial, erguida no antigo casarão que pertenceu ao Seu Teixeira,
pai da minha amiga "Medinha" que mora em Brasília.Quando criança, eu
passava as tardes livres em cima do muro, olhando as vacas, sentido de cheiro
de leite, do estrume e do capim verde.
Depois vem a casa da Carmosina que mora no Tocantins. A casa vive
fechada pois ela só anda por aqui nas suas férias.Sua irmã Fátima, mora em
Goiânia. Em frente, a casa do Seu Tatá, que morou a minha amiga Atair
Lima. Por muito tempo também, morou nessa casa a Socorrinha Lustosa, o Brandão (seu
esposo) e os filhos Glauber e Gledson.
Ao lado da minha casa, morou o fotógrafo Saraiva e sua família, o
taxista Chapeuzinho e Dona Luzia, mãe do amigo Netinho. Na outra esquina
da rua fica a casa do Dr. Ferdinand Ibiapina e Dona Ana. Pais da Luciana, Fabio
e João Gayoso. A primeira casa com piscina da rua e lotada de ar condicionados
por todos os lados.
Em frente, a casa da Sr. Antonio Lustosa, esposo de dona Maria Emília. Pais
do Roberto, Antonio Jr. e Rosângela. Atualmente. mora a Socorrinha Lustosa. Ligados
a essa casa, fica o sobrado do Sr.Raimundo Lustosa de Melo, onde ainda vive a
Dona Doninha e o seu neto Decinho.
Logo depois, a casa da Dr. Expedito,
irmão do Sr. Gentil. Por muito tempo a casa foi morada do Sr. Quaresma, pai da
Goreth e da Cássia. Em frente a essa casa, fica a casa do Erimar, filho
do Sr. Euripim e do lado a casa do Rômulo Gentil.
Descendo, vem a casa da Magnólia Cardoso, mãe da Nádia, que é casada com
um alemão.Em frente, a casa da Maria Aragão, ex-funcionária das Casas do Sul e
sua irmã, a professora Eliane.
Depois vem a casa da Ana e Ada Vasconcelos, filhas do Seu Zuza, um dos
primeiros dentistas da cidade. Próximo a elas, fica a casa do Seu Dema, o
ourives. Ainda temos a casa do falecido pedreiro Zé da Marizoca e um terreno
onde morou uma velha benzedeira chamada Zefa do Carumbé. Morava sozinha, e sua
casinha simples e humilde ficava quase debaixo de um enorme pé da cajá. Meu
Deus, o que será que fizeram com esse pé de cajá?
Quero também homenagear os felizes moradores da
Padre Fabio, que se foram, e deixaram enormes saudades.
Danilo Barros (sobrinho).
Dirce Barros (irmã).
Chico Barros (papai).
Glória Caroline (sobrinha).
Didico Lustosa (cunhado).
Dona Mazé Peres (esposa
do Sr. Zé Peres).
Evaldo Peres (filho
de dona Mazé).
Sr. Gonçalo
Carvalho (esposo de Dona Maria do Carmo).
Wilson Carvalho (irmão
da Jurandir e Jacira).
Janderson (filho
de dona Teresinha e Eduardo).
Raimundo Lustosa
de Melo.
Dona Branca (irmã
do Sr. Raimundo).
Luis Bodão (filho
do Sr. Raimundo).
Robet Lustosa (neto).
Luis Sergio (neto).
Antonio Lustosa e
Dona Maria Emília.
Roberto Lustosa (filho
do casal acima).
Sr.Zuza (dentista).
Brandão (esposo
da Socorrrinha Lustosa).
Bá (babá da
Luciana e Fábio Gayoso).
Dona Luzia (esposa
do Seu Bobó, motorista de trator ).
Keylane (irmã do
Deolindo, patrulheiro rodoviário).
Sr. Luis (pai do
Julinho da Miscelândea).
Zé Secretário (taxista).
Rui (filho de
dona Maria e Seu Manel).
Dona Francisca
Aragão e Sr. Antonio (pais da Maria e Eliane Aragão).
Dona Julieta (mãe
da Lurdinha Barros).
Dona Fransquinha (mãe/avó
da Maria Augusta).
Abraços a todos e
lembrando que recordar é viver.
Sergio Emiliano.
agosto/2013.