Último dia do ano.
São seis horas da manhã e ouço a Ave Maria que vem do alto da torre da igreja. A rua não acordou pois o leiteiro não passou gritando e nem os feirantes arrastam chinelos conversando rumo ao mercado. No fundo, eu esperava que fosse um dia diferente , que não fosse tempo de lua cheia que ainda brilha num céu sem sol.
Sinto uma tristeza quando ouço os primeiros sons que vem da cozinha enquanto a mamãe faz o café. É como se a calma desse último dia, provasse uma dor enquanto vai sendo quebrada. O som característico do fogão sendo ligado...tríiiiiiiiisssss. A água da torneira vai caindo na pia de inox e se mistura com o café frio de ontem desemborcando no rego ainda seco, invadindo assim, as raízes do pé de limão já extremamente úmidas.
Deitado, vou tentando decifrar todos os sons. O chacoalhar dos talheres sendo jogados na mesa, o pires se separando da xícara, o barulho da cuscuzeira fervendo deixando subir a fumaça quente com cheiro de
milho. Aporta da geladeira se fecha e sei com absoluta certeza que de lá saiu a manteiga, o queijo duro e um melão daqueles bem doce.
milho. Aporta da geladeira se fecha e sei com absoluta certeza que de lá saiu a manteiga, o queijo duro e um melão daqueles bem doce.
Último dia do ano que não amanheceu chovendo como ontem. Caiu uma chuva tão fina, que não se conseguia ouvir ela batendo no telhado, nem escorregando pela calha de zinco.
Ainda sem querer levantar, sou asfixiado pelo cheiro do café e pulo da rede. Abro o freezer e retiro uma banda de leitão. Será descongelado e temperado para o almoço do dia primeiro. São as crendices que nos
contaminam e fazemos de conta que acreditamos piamente. Ainda bem que temos romãs maduras no quintal. Já pensou?
contaminam e fazemos de conta que acreditamos piamente. Ainda bem que temos romãs maduras no quintal. Já pensou?
A televisão foi ligada e exibe uma reportagem sobre a queima de fogos no réveillon do Rio. A mesma coisa do ano passado: as balsas, o chuvisco eterno durante a noite e turistas embasbacados com a beleza
de Copacabana.
de Copacabana.
Por aqui, logo mais à noite, consegui reunir uns trinta amigos. Beberemos, torceremos uns pelos outros, tocará um dance sofisticado e a gula será saciada. São ritos, são repetições em que não abro mão, pois me faz sentir vivo.
Zero o calendário gregoriano, zero as contas...2012 já será passado e como tal, deverá ser esquecido. Passou, vamos atrás de novas emoções e eu estou de peito aberto esperando por elas.
Feliz ano novo para todos.