quinta-feira, 7 de agosto de 2014

O VAQUEIRO, O CACHORRO E O MACACO.




Francisco Manduri, mais conhecido pela alcunha de Chico Farofa ou simplesmente Farofa, por mais de uma década vaqueirou na fazenda “Curral Velho”, de propriedade de Terto Manso, também conhecido pelo apodo de “Tertogalça”.
Nas décadas de 1930/40, quando o gado vacum era criado sob o regime de extensão, campo aberto, a tarefa preponderante de um vaqueiro consistia em campear: monitorar e inspecionar o rebanho sob sua responsabilidade. Para tanto dispunha dos cavalos campeiros, por vezes nomeados de boiadeiros. Durante a campeação se fazia acompanhar de um bom rafeiro para ajudar nas reses esquivas ou no resgate daquelas que viessem a tresmalhar.
Certa feita, quando campeava pelos socavões e bibocas do latifúndio, Farofa deparou-se com um macaquinho recém-nascido. Desamparado e debilitado, o bebê apresentava visíveis sinais de inanição. Prontamente Farofa regressou a casa a fim de alimentar o recente. Em poucos dias o macaquinho, agora forte e nutrido, revelou o que é da essência dos macacos: travessuras.  Suas divertidas traquinices enchiam a casa de bom humor. De tanto assistir o vaqueiro montar e sair a cavalo diariamente, acompanhado do Baliza, seu fiel rafeiro, o macaquinho, certa feita, para surpresa de Farofa, pulou no pescoço do Predileto, apelido de um dos cavalos, e firmou-se em suas crinas. O que se supunha ser um gesto isolado do macaco tornou-se uma rotina: bastava encilhar o Predileto e o macaquinho, agora alcunhado de Pinga-Fogo, agarrava-se às crinas do animal e só desgrudava quando Farofa regressava das lidas campesinas. Para não atrapalhar os movimentos do vaqueiro, sobretudo quando precisava inclinar-se sobre o pescoço do cavalo, Farofa ensinou Pinga-Fogo a montar no dorso do Baliza. Para quem se revelara bom aluno de equitação no pescoço do Predileto, Pinga-Fogo rapidamente se tornou um excelente ginete no dorso do Baliza. A dupla estava formada. Havia entre eles uma relação de companheirismo aprofundava pelo labor sertanejo. Quando Farofa parava em uma fonte para dessedentar a si e o cavalo, Baliza e Pinga-Fogo também se saciavam. A companhia de um vaqueiro mirim, montado no cachorro, acabou por transformar a obrigação de Farofa em pura diversão. Mas era preciso zelar pela integridade física do vaqueiro coadjutor. Nesse sentido Farofa mandara o modista da sola, o soleiro, confeccionar um terno de couro para Pinga-Fogo; protegê-lo dos espinhos. Tudo ocorria de modo rotineiro com a dupla quando certo dia, ao regressar a casa, sol pendido, Farofa estranhou o retardo de Baliza e Pinga-Fogo. A demora foi-se acentuando e Farofa, depois de esperar o quanto pôde, encilhou o cavalo e retornou em busca dos amigos evidentemente seguindo o mesmo trajeto por onde havia passado. Ao divisar uma nuvem de urubus, que planavam denunciando carniça, Farofa intuiu que ali estava a razão por que se verificava o atraso dos amigos. Ao se aproximar Farofa constatou que se tratava realmente de uma carniça com que Baliza repimpava a barriga. Enquanto Baliza saciava seu instinto repugnante, Pinga-Fogo, impacientado e contrafeito, aguardava sobre um galho de jatobá do campo com a cabeça recostada ao chapéu-de-couro que lhe servia de travesseiro. Ao perceber a chegado do seu amo Pinga-Fogo, num átimo, voou nas crinas do Predileto e retornou para a casa, feliz. Desse dia em diante Pinga-Fogo não amais aceitou seu animal de montaria. Preferiu mesmo permanecer em casa na companhia de Dona Malvina e seu filho Chico Junior, o Farofinha.

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