Por Plínio Fraga | Plínio Fraga – 9 horas atrás
Não é o que irá acontecer, mas um grande tema para o debate do
segundo turno pode ter sido levantado por Marina Silva. A candidata do
PSB colocou como uma das exigências para apoiar Aécio Neves (PSDB) a
revisão da proposta do tucano de referendar a necessidade de redução da
maioridade penal em discussão no Congresso há 15 anos.
Primeiro é preciso entender do que se trata. Desde 1999,
parlamentares apresentaram dezenas de propostas com esse objetivo. Em
2007, foram reunidas seis das propostas de emenda à Constituição e
aglutinadas em um projeto substitutivo que reduz a maioridade penal para
16 anos nos casos de crime hediondo e dos equiparados a este, como
tráfico, tortura e terrorismo, desde que laudo técnico psicológico,
elaborado por junta designada por juiz, ateste a plena capacidade de
entendimento do adolescente que praticou o ato ilícito. A
proposta sugere que o cumprimento da pena seja realizado em local
distinto daquele em que estarão detidos os maiores de 18 anos.
Em 2010, comissão do Senado rejeitou a redução da maioridade penal,
entendida como inconstitucional e com potencial violação dos direitos
das crianças e dos adolescentes. O texto base em votação era de autoria
do senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP), candidato a vice de Aécio.
Em março deste ano, Ferreira conseguiu a promessa do presidente do
Senado, Renan Calheiros, de que o projeto seria levado ao plenário,
instância máxima que pode derrubar a rejeição da comissão que o analisou
primeiro.
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Aécio não votou texto sobre redução da maioridade penal
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Segundo pesquisas recentes do Datafolha e do Instituto Sensus, mais
de 90% dos eleitores brasileiros são a favor da redução da maioridade
penal. A cada vez que um crime envolvendo adolescentes é divulgado na
mídia a taxa sobe ainda mais. Há um quê de demanda histérica, pouco
racional, porque pouco debatida, analisada e comentada.
Aécio Neves e seu vice, Aloysio Nunes, sabem do potencial eleitoral da proposta.
Marina Silva e Dilma Rousseff (PT) são contra a medida. O
coordenador de Juventude da campanha de Aécio, José Júnior, é contra. O
Unicef (fundo para infância e juventude da ONU), o papa Francisco e mais
de 80 entidades de proteção aos direitos humanos e das crianças e
adolescentes são contra a medida. “Endurecer as penas com frequência não
leva à redução da criminalidade”, escreveu o papa, em carta, de julho
passado, à Associação Latino-Americano de Criminologia.
Eleitoralmente, Aécio recuar agora para satisfazer Marina é uma ideia
absurda, com chances grandes de desgaste para o tucano. Já disse que
não pretende fazê-lo. Resta saber se essa recusa impedirá Marina de
apoiá-lo e qual o efeito disso perante os eleitores.
Mas elevaria o nível da campanha se o debate sobre a redução da
maioridade, ausente da agenda da mídia, fosse agora feito. Aécio poderia
ampliar seus argumentos, ou poderia revê-los, dignamente como pede o
processo democrático. A principal argumentação de Aécio para defender a
maioridade penal é que reduz a sensação de impunidade que estimula a
criminalidade. Em seu programa de governo, o candidato endossa o projeto
do vice, Aloysio Nunes, sem estender-se.
Os grupos de defesa de direitos humanos enumeraram 18 razões para
serem contra a redução da maioridade penal. Pinço algumas delas. Afirmam
que hoje, a partir dos 12 anos, qualquer adolescente já é
responsabilizado pelo ato cometido contra a lei. Essa responsabilização é
executada por meio de medidas socioeducativas, com o objetivo de
ajudá-lo a recomeçar e a prepará-lo para uma vida adulta. O Estatuto da
Criança e do Adolescente prevê como medidas educativas: advertência,
obrigação de reparar o dano, prestação de serviços à comunidade,
liberdade assistida, semiliberdade e internação. Recomenda que a medida
seja aplicada de acordo com a capacidade de cumpri-la, as circunstâncias
do fato e a gravidade da infração. O problema é que na maior parte das
vezes a lei que já existe não é cumprida.
Muitos adolescentes que são privados de sua liberdade não ficam em
instituições preparadas para sua reeducação, reproduzindo o ambiente de
uma prisão comum. Pela lei atual, o adolescente pode ficar até nove anos
em medidas socioeducativas, sendo três anos como interno, três em
semiliberdade e três em liberdade assistida, com o Estado acompanhando e
ajudando-o a se reinserir na sociedade. O problema é que em geral o
Estado não exerce o seu papel.
A discussão sobre maioridade penal não é sobre punição ou não
punição. É sobre encarceramento. No Brasil, 70% dos presos voltam a
cometer crimes, um indício de que o sistema penal é mais escola do crime
do que entidade de recuperação social. Não há estudo ou pesquisa que
mostre que o rebaixamento da idade penal diminua a criminalidade
juvenil. O papa está certo nesse caso.
Entidades do setor dizem que a reincidência de crianças e
adolescentes submetidos a medidas socioeducativas está em 20%, quase
três vezes menos do que a taxa de reincidência das cadeias brasileiras.
O Brasil tem a 4° maior população carcerária do mundo e um sistema
prisional superlotado com 500 mil presos. Só fica atrás em número de
presos para os Estados Unidos (2,2 milhões), China (1,6 milhões) e
Rússia (740 mil). E a criminalidade continua em linha ascendente.
Alemanha e Espanha (com recorde de desemprego entre os jovens) elevaram
recentemente para 18 anos a idade penal, sendo que os alemães criaram
ainda um sistema especial para julgar os jovens na faixa de 18 a 21
anos.
De uma lista de 54 países analisados pela ONU, a maioria deles adota a
idade de responsabilidade penal absoluta aos 18 anos de idade, como é o
caso brasileiro. São minoria os países que definem o adulto como pessoa
menor de 18 anos. Das 57 legislações analisadas, só 17% adotam idade
menor do que 18 anos como critério para a definição legal de adulto.
Calcula-se que cerca de 90 mil adolescentes respondem por atos
infracionais no Brasil. Destes, cerca de 30 mil cumprem medidas
socioeducativas. O número corresponde a 0,5% da população jovem do
Brasil que conta com 21 milhões de meninos e meninas entre 12 e 18 anos.
Os homicídios de crianças e adolescentes brasileiros cresceram nas
últimas décadas. São quase nove mil por ano, o equivalente a 24
assassinatos de crianças e adolescentes por dia. A Organização Mundial
de Saúde diz que o Brasil ocupa a 4° posição entre 92 países do mundo
analisados em pesquisa. Aqui são 13 homicídios para cada 100 mil
crianças e adolescentes; de 50 a 150 vezes maior que países como
Inglaterra, Portugal, Espanha, Irlanda, Itália, Egito cujas taxas mal
chegam a 0,2 homicídios para a mesma quantidade de crianças e
adolescentes.
A educação é fundamental para qualquer indivíduo se tornar um
cidadão. Punir jovens com o encarceramento sem que o Estado assuma a
própria incompetência em lhes assegurar o direito básico à educação é
marca de uma sociedade cruel.
As causas da violência e da desigualdade social não se resolverão com
adoção de leis penais mais severas. O processo exige que sejam tomadas
medidas capazes de romper com a banalização da violência e seu ciclo.
Investir em educação é mais trabalhoso, exige esforços e recursos
conjuntos, mas dá mais resultados na construção de uma nação. Os jovens
não podem ser os vilões nem serem usados como boi de piranha para atrair
votos.
Crédito foto e matéria:
https://br.noticias.yahoo.com/blogs/plinio-fraga/
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