segunda-feira, 7 de novembro de 2016

Qual sua opinião sobre as vaquejadas?

Mais uma opinião nos chega. Esta vem de Brasília, onde mora o nosso conterrâneo Jacob Fortes, escritor campo-maiorense que sempre nos brinda com seus pontos de vista.

SOFRIMENTO ANIMAL: O PRAZER DOS SÁDICOS. (Por Jacob Fortes. 07.11.2016).

Há pouco, o Supremo Tribunal Federal, acatando ação de inconstitucionalidade, derrogou os mandamentos da lei cearense, 15.299/2013, que regulamentava a vaquejada naquele estado. Agora, 01.11.2016, em contraposição, o Congresso Nacional aprovou projeto de lei que admite a vaquejada como legítima manifestação cultural do Brasil; o texto será submetido ao Presidente da República. Não se pode prognosticar o epílogo dessas decisões, antagônicas, subscritas por esses titãs: Judiciário de um lado, Legislativo de outro. O que de certo se pode almejar é que a iniciativa do Congresso tenda ao fracasso; as vaquejadas são exemplos frisantes de maus-tratos aos animais. A prática, revoltante, consiste em enclausurar o boi, instigá-lo e pô-lo em “liberdade” numa pista onde passa ser encalçado por dois vaqueiros montados em cavalos boiadeiros até que seja derrubado, de modo cabal, com as patas para cima. O procedimento, desapiedado, não raro acomete os animais de graves lesões: costela quebrada, perda da cauda, ruptura de ligamentos, etc. Em alguns estados, sobremodo Santa Catarina, a tirania recebe o nome festivo de a farra do boi: os farristas, bestiais, aficionados da prática, “soltam” o animal para que, em seguida, seja submetido a todo tipo de agressão até que, caído, não consiga mais se levantar.  É o horror sublinhando o instinto violento de uma comunidade sulista que, sentindo-se preexcelente, preeminente, ainda mais porque feita predominantemente de genética europeia, inscreve o seu nome, em alto-relevo, nos anais separatistas do estado.

Mas a prática que o Supremo Tribunal elidiu — que servia a propósitos sádicos e lucrativos — nem de longe se compara à ignominiosa barbárie de que é feito o glamour das touradas espanholas. Depois de exacerbado o furor do boi, “libertam-no” numa arena para que se dê início ao espetaculoso e sinistro flagelo do mártir: o touro. O toureiro, embrutecido pela ação do seu instinto sanguinolento, vai cravando espadas de ponta perfurante no dorso do animal cujas sangraduras fazem borbotar cachoeiras de sangue, circunstância que o torna gradualmente hipovolêmico. Não tarda para que, exangue, caia desfalecido. Tudo isso sob o delírio apoteótico de uma multidão “civilizada”, gente do primeiro mundo, de primeira classe. Enquanto as touricidas, (espetáculo facinoroso), sintetizam, em dimensões mundiais, o assombro e a perplexidade, a Espanha, insensível, se vê comodamente no procedimento rotineiro da arte e da cultura. É a malevolência, como sempre, subterfugindo as bestialidades humanas.

Até quando? Essa era a pergunta comumente feita durante o regime escravista; tomo-a por empréstimo e transfiro-a para as touradas. Mesmo que seja uma alucinação onírica, o mundo anseia que as touradas, travestidas de manifestação cultural, sejam abolidas do solo espanhol talqualmente a escravidão o fora no Brasil; é o apelo dos povos.  Para efeito dessa aspiração qualquer circunstância será bem-vinda, inclusive que os espanhóis se acometam de sentimento de nojo das suas próprias impiedades; se aterrorizem das suas ações macabras. Quando essa tradição, abominável, for excluída do patrimônio hereditário das gerações espanholas, a Espanha há de envergonhar-se da sua historiografia, de haver-se esbaldado na barbárie, de ter protagonizado medonho drama sanguinolento. Nessa ocasião as novas gerações, agora evoluídas para o nível da “incivilidade”, passarão a matar bois apenas para atender aos reclamos do bucho, não para fins recreativos ao estilo dos felinos: “{...} hoje brincas à vontade, como o gato sem piedade, faz o rato padecer {...}”. Atrás dos mal-afamados touricídios, — que melhor retratam as feições da Espanha, e que rendem aplausos nacionais, mas apupos no estrangeiro, — subjaz a hediondez de instintos sicários.

Ponha-se termo a esse tango, trágico, raiado de sangue, que tantas dores resumem; substitua-o por outros ritmos (mambo, polca, salsa, merengue, etc.), de maior alacridade, que melhor adocem os costumes. Esse cardápio, indigesto, — que remete às cavernas e requer substituição por algo mais frugal — não honra magnas figuras espanholas, que as faço representar aqui por Miguel de Cervantes Saavedra.

Dar-me-ei por satisfeito se este singelo arrazoado vier a expandir a consciência do leitor em desfavor da judiaria dos seres viventes.




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